CAPÍTULO 3

Do livro “Sabedoria Maravilhosa”

DESEJO – O COMBUSTÍVEL QUE NOS PROPULSIONA

Nós comemos porque estamos com fome ou porque não queremos ficar com fome? Nós coçamos nossos narizes por comichão ou porque nós queremos que eles parem de ter comichão? Quando éramos adolescentes, nós limpávamos os nossos quartos ao invés de fazer algo divertido porque nós queríamos limpar nossos quartos, ou porque nós não queríamos os nossos  pais bravos conosco? Eu poderia seguir por diante com estas questões retóricas, mas eu penso que a maioria dos leitores saberá onde tudo isto nos leva.

Cada ato que fazemos, nasce de um desejo. Do menor, mais insignificante e consciente ato, às ações que requerem vastas quantidades de energia, todos eles são feitos por uma única razão: um desejo entrou em nós e nos afetou o suficiente para agirmos de forma a preenchê-lo. A Cabala chama a Força que nos propulsiona ao preenchimento destes desejos de “a vontade de receber”.

Nós somos completamente controlados por desejos; sem um desejo, nós permanecemos perfeitamente imóveis, sem nos mexer um centímetro sequer. Mas qual é a meta? O que nós estamos tentando alcançar através de consciente ou inconscientemente seguir os nossos desejos? A resposta é prazer. Nós os perseguimos a fim de receber prazer de uma forma ou de outra.

Às vezes aquele prazer pode ser a sensação de fazer algo que nós acreditamos ser a coisa certa a ser feita. Outras vezes isto pode ser às custas da felicidade de outrem. Mas não importa qual é o desejo, é o desejo de receber que é a força basilar, que literalmente nos guia pelo nariz de forma a agirmos de uma maneira que satisfaça o desejo.

Este desejo de receber é tão complexo e perspicaz que na melhor das hipóteses, nós raramente percebemos que somos escravos dele. Claro que ninguém no seu perfeito juízo admite que seja escravo de alguém ou de algo. Mas, se a pessoa pára para refletir seriamente porque ele ou ela faz certas coisas, até mesmo ações da mais alta moral, existe somente uma conclusão que explica todas as ações. Nós agimos somente para receber prazer para nós mesmos…… ponto final.

Este é um conceito excepcionalmente difícil de entender.  Como professor de Cabala, eu noto que, a maioria dos estudantes ao início debate-se com tal conceito. Eu, imediatamente recebo uma litania de exemplos de alunos tentando mostrar que o descrito acima está absolutamente errado. Alguns desses exemplos incluem os milhões de pessoas que doam para caridades todos os dias, um homem se joga em cima de uma Granada durante  uma guerra  para  salvar  crianças.  A  Madre  Teresa  construindo  orfanatos  para crianças, a lista é virtualmente sem fim. Ainda assim, quando eu pergunto porque pensam eles que essas pessoas fizeram o que fizeram, a resposta final não é “para salvar a vida das crianças.” É porque a pessoa que fez tal ação sentiu que era a coisa certa a fazer.

Em outras palavras, no julgamento destas pessoas, o ato correto foi determinado por ser exatamente o que eles fizeram. De fato, cada pessoa em cada exemplo fez algo que talvez possa até ter tido um impacto negativo causando grandes sacrifícios a elas mesmas, mas elas não seriam felizes com nenhuma outra ação. Por exemplo, no caso da granada de mão, o soldado colocou o valor da vida das crianças acima da sua própria vida, tornando assim impossível não realizar a ação que fez.

O desejo de receber prazer é tão poderoso que pode até mesmo cancelar a gratificação imediata, tais quais como segurança ou dinheiro, para que no futuro um prazer maior possa ser recebido. No final das contas, se nós tivermos alguma participação em algum resultado, se nós calcularmos maneiras de atingir este resultado, o nosso desejo de receber tomou aquela decisão.

Então, o que acontece realmente com o desejo de receber e por que causa tais ações quando o desejo se apresenta? A resposta é simples – um juízo é feito. Um cálculo ocorre respeitante ao prazer que uma ação pode trazer versus ações alternativas e o prazer que elas podem talvez trazer. Este cálculo ocorre a uma velocidade relâmpago, e nem sempre requer um pensamento consciente. Que ferramenta engenhosa tem tal capacidade para realizar estes cálculos e fazê-los literalmente milhões de vezes ao dia? A resposta está bem entre as nossas orelhas: a maravilha de um computador biológico ao qual nós chamamos cérebro. Nós iremos falar mais sobre esta miraculosa máquina de calcular, mais adiante.

A vontade de receber está desenvolvida de tal modo perfeito em nós, que isto perturba a mente ao considerar quantas ações controla a cada segundo. Cada função do corpo opera através deste meio ambiente. Todos os sistemas agem de maneira coordenada para assegurar a mais alta eficiência para a sobrevivência mínima de uma pessoa, num nível inconsciente; todos os cálculos que requerem um processo cognitivo consciente ocorrem simultaneamente.

Cada segundo, ou cada movimento que fazemos, seja balançando na cadeira do escritório para ajudar a acalmar o estresse ou trazer flores para as nossas esposas depois do trabalho, é o desejo de receber que é deliberado, analisado e calculado antes que qualquer ação aconteça. A maior parte deste processo passa completamente despercebido, sem qualquer esforço cognitivo. Sente-se de braços cruzados e pense por um momento quantos movimentos individuais são necessários para se levantar e pegar num copo de água  quando estamos com sede.

Claro que, aí existe também um cálculo. Entre no cérebro. Os nossos sistemas biológicos detectam o desejo por água, então nós sentimos sede. Nós agora podemos ou não ir buscar um copo de água. Isso depende dos cálculos do cérebro. Por exemplo, se nós estamos sentados em frente á televisão assistindo ao nosso programa preferido ou a um jogo de bola particularmente interessante, nós talvez abriremos mão daquele desejo, pelo menos até o próximo anúncio comercial.

O que aconteceu? O cérebro fez o cálculo, pesando o prazer que nós iríamos receber ao sair da poltrona agora, e ir pegar água em oposição ao prazer que nós sentimos com o que estamos assistindo. Se o indivíduo aqui é um homem, e a sua esposa assiste á sua novela preferida, ele não irá hesitar em levantar-se e pegar água. Mas se for o Campeonato do Mundo e a sua seleção está jogando, a água pode esperar.

O cálculo feito a, como e quando se executar uma ação é um cálculo de trabalho. Esta é a fórmula fundamental que ocorre no cérebro: possível prazer recebido versus o trabalho necessário para receber o prazer. Se estivermos muito doentes, deitados na cama dormindo e o telefone toca à noite, nós provavelmente não iremos sair da cama para atendê-lo. Mas se a casa está pegando fogo nós podemos estar literalmente no nosso leito da morte, mas nós iremos sair de casa, de alguma maneira. O cérebro dá prioridade. Ele corresponde, compara, avalia e toma uma decisão baseado no resultado da sua análise. Uma vez a decisão feita, então somente existe uma ação.

No caso de desejo como sede por água, é fácil ver como o desejo de receber funciona. A confusão acontece quando nós começamos a considerar ações onde a pessoa está aparentemente dando aos outros, assim como pessoas que apóiam caridades, ou Escoteiros que ajudam a velhinha a atravessar a rua. A resposta é que existem duas maneiras de receber para si mesmo.

A primeira é a mais simples: o desejo de receber com a finalidade de receber. A segunda é o desejo de dar para receber. Assim como mencionado anteriormente, o desejo de receber é excepcionalmente perspicaz. Não só encontra maneiras de receber simplesmente para si mesmo, como pode até mesmo encontrar maneiras de receber por dar aos outros.

Na superfície, isto não faz qualquer sentido. Que prazer pode uma pessoa possivelmente receber ao dar? Claro que, quem já foi a uma festa de aniversário, e levou um presente para o amigo e o colocou na mesa com os restantes presentes, está bem ciente de como mal pode esperar para que o  seu amigo abra o presente que trouxe. De fato, é da mais alta importância que o presente que levou seja apreciado pelo aniversariante. Caso contrário, existe um profundo sentimento de tristeza, um desapontamento que é muito difícil de explicar. De fato, nós também sentimos certo tipo de prazer por um ato de doação.

Algumas pessoas descobriram quão agradável este tipo de recepção pode ser, e literalmente dão milhões de dólares para caridades pelo mundo todo. Não é que eles gostem necessariamente de gastar o seu dinheiro ganho através de trabalho duro, é que simplesmente eles recebem um prazer que é maior ao dar do que poupar e gastar só com eles mesmos. De fato, algumas pessoas são tão dependentes deste tipo de prazer que se você fosse de alguma maneira proibi-los de continuar com isso, eles considerariam que não vale mais a pena viver.

É importante esclarecer aqui, que a Cabala não diz que as pessoas que recebem com a finalidade de receber, ou dão com a finalidade de receber são de alguma maneira, más. De fato, é bem ao contrário e existe uma razão especial para isto. Veja, aqueles desejos que causam tais ações vêem diretamente do Criador. Diariamente, as pessoas seguem simplesmente o programa sob o qual elas foram criadas. Assim como um computador sofisticado que diz “se sim, faça isto, se não, faça aquilo”, elas caminham  felizes no dia a dia, recebendo desejos, calculando, e satisfazendo – ou não – dependendo dos resultados do cálculo.

As pessoas recebem os seus desejos de dois lugares distintos. Primeiro, existem os desejos animais, que são os mesmos de qualquer outro animal biológico. Estes desejos por comida, descanso, abrigo e procriação são genéticos e evidentes, não importa se a pessoa vive em sociedade ou não. O que nós precisamos realmente? Precisamos de um pedaço de comida para mastigar, uma caverna para nos abrigarmos dos elementos atmosféricos e  para descanso, um parceiro para satisfazermos os desejos físicos e de procriação, tal como qualquer outro animal.

Depois a sociedade assume o controle. Existem desejos, tais como dinheiro, honra, conhecimento e poder que nós dependemos da  sociedade para obtê-los. O que estes nos oferecem? O dinheiro determina se nós comemos aquele pedaço de comida ou se nós saboreamos um filé mignon nalgum restaurante caro. Este determina também se nós ficamos na caverna  ou se vivemos numa mansão de 20 quartos, ou qualquer coisa pelo meio. Por vezes, o dinheiro determina até mesmo, o parceiro que nós escolhemos.

Todos querem se sentir bem com eles mesmos, e se não incomodá-los, isto não exige muito esforço.

Todavia, é aqui que a sociedade começa realmente a entrar em jogo. Como? A nossa opinião a respeito do nosso valor pessoal, é drasticamente influenciada por como somos considerados pela sociedade na qual vivemos. Não é de admirar que o mendigo, desempregado e todos aqueles com problemas de droga têm pouca, ou nenhuma auto-estima. Tudo o que é preciso fazer é observar como a sociedade vê tais pessoas.

Depois, existe o nosso meio ambiente mais próximo. Todos nós já experienciamos a síndrome de “fazer ou ter como o vizinho”. Se o nosso meio ambiente mais próximo nos ditar que é importante ter certo tipo de carro, você verá garagens cheias deles. Se há certo estilo de cabelo, toda a mulher o estará usando. Se caçar é o que determina a masculinidade de um indivíduo em certa área, caçar será um esporte popular. Por outras palavras, a nossa sociedade fornece-nos com o que ela considera importante nestas áreas.

Hoje, uma formação universitária é uma necessidade virtual ou real. De fato, o seu valor mais se compara ao valor de uma formação do segundo grau alguns anos atrás, quando o diploma do segundo grau era considerado uma “vantagem”. No mundo atual da tecnologia, o diploma de pós-graduação é a vantagem.

Mas, se uma pessoa se muda para um país atingido pela pobreza e é deixada lá sem posses, as mais simples questões de sobrevivência serão consideradas da mais alta importância. Comer, beber e ter abrigo pode ser considerado honroso, enquanto educação não significará virtualmente nada, exceto talvez para se escapar deste ambiente desafiador.

Claro, que nós temos alguma liberdade de escolha. As modas atuais oferecem uma variedade de cores e formas, o último tipo de carro virá em modelos diferentes, feito por diferentes companhias, e nós temos uma variedade de escolhas para aquele diploma universitário. Mas mesmo nestes, as nossas escolhas serão baseadas em desejos, o que compreendemos dar- nos-á maior prazer. Se algo em mim prefere o verde, a probabilidade é que o meu carro será verde. Por quê? Porque eu me sinto melhor com um carro verde.

Para resumir, toda a ação é predeterminada pelos nossos desejos e de cada um de nós. Nós recebemos estes desejos de duas fontes diferentes: da nossa genética e do nosso meio ambiente. Nós somos pressionados de uma maneira ou de outra a satisfazer o que nós calculamos que nos irá trazer maior prazer, baseados nos desejos que nós recebemos. Contrariar estas pressões é praticamente impossível.

Os desejos da sociedade entram em nós através dos nossos cinco sentidos. Quando nós cheiramos uma torta de maçã, um desejo que anteriormente não estava lá aparece. Existe alguém que só comeu uma batata frita e não estendeu a mão para pegar outra? O sentido do paladar imediatamente é aguçado e de repente, nós sentimos que a nossa vida será incompleta sem a próxima batata frita.

Mas existe mais um desejo; o desejo mencionado no primeiro capítulo deste livro. Qual é este desejo e de onde vem ele? Por que ele primeiro nos provoca, depois nos irrita, e finalmente nos leva a procurar respostas? Qual é a base fundamental para este desejo e como o realizar? Quem somos nós, realmente? A resposta está na descoberta singular daquela entidade espiritual chamada “a alma!”

 

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