Recobrando a Consciência

Do livro “Cabala, Ciência e o Sentido da Vida”

Nós e o Mundo

Desde o nascimento, nós possuímos as ferramentas para perceber a realidade física. Dentro dessas ferramentas estão “bits de informações” sobre os estados e condições que estamos destinados a realizar — as Reshimot. Por meio da influência da educação e do ambiente em que vivemos, nossas ferramentas se desenvolvem até que tenhamos uma percepção “normal” da realidade física.

Porém, este não é o caso no que se refere à percepção da realidade espiritual. Nós não possuímos nenhum “padrão” pelo qual possamos testar se estamos construindo nossos vasos interiores corretamente, de forma a revelar o atributo de doação e a descoberta da realidade espiritual.

Nós não sabemos o que fazer com os nossos desejos, como dar forma a eles, e com que intenção devemos prepará-los. Para nos ajudar nesta tarefa, os Cabalistas nos fornecem as definições necessárias. Eles nos ensinam como podemos calibrar nossas ferramentas de percepção para percebermos a realidade espiritual.

Nós percebemos a realidade física de forma predeterminada; nós nascemos e crescemos sem sermos questionados sobre a nossa opinião a respeito desse assunto. Os padrões de percepção física que foram formados em nós durante o nosso amadurecimento, nos fazem sentir a Luz do Mundo de Ein Sof. Essa Luz, na realidade, está oposta a nós o tempo todo: a realidade física  dentro da qual nós e o mundo a nossa volta existem.

Apesar disso, no que diz respeito à realidade espiritual, nada é pré-determinado. Nós temos que encontrar nossas próprias formas de percepção da espiritualidade, e somente as ferramentas que nós construirmos fornecerão a cada um de nós o entendimento sobre o Criador, a Força Superior que tudo constrói e influencia.

Nós deveríamos ter em mente que a realidade é formada dentro de nós. Nossas qualidades interiores refletem uma “sombra” sobre a Luz abstrata, criando assim nossa imagem do mundo, tanto espiritual como físico. Assim, a maneira com a qual nós perceberemos o Criador dependerá somente de nossas próprias qualidades.

*

A sabedoria da Cabala tem mantido sua posição em relação à percepção da realidade por milhares de anos. Inversamente, a ciência cultivou sua abordagem através de diversos estágios muito importantes.

A percepção clássica, cujo protagonista foi Isaac Newton, declara que o mundo existe por si mesmo, sem considerar se estamos ou não lá para percebê-lo. Assim que a ciência biológica se desenvolveu, ela possibilitou que víssemos o mundo através dos olhos de outras criaturas. Nós descobrimos que diversos animais percebem o mundo de maneira muito diferente.

Por exemplo, a abelha vê milhares de imagens, que se misturam para criar uma imagem do mundo a sua volta. O cachorro percebe o mundo, O cachorro percebe o mundo, antes de tudo, como “borrões de aroma”. Por isso, Einstein descobriu que a mudança da velocidade do observador produzia uma imagem completamente diferente da realidade.

Essas descobertas revelaram uma segunda abordagem, a qual afirma que a imagem do mundo depende do observador. Observadores com qualidades e sentidos diferentes percebiam uma imagem diferente do mundo. Portanto, como na primeira abordagem, o mundo continuava existindo independente dos seus observadores. A diferença entre a primeira e a segunda abordagem é que o mundo parece diferente aos olhos de observadores diferentes.

Uma terceira abordagem desenvolvida sugeria que o observador afeta o mundo, e, portanto, afeta a imagem percebida. De acordo com a terceira escola, a percepção da realidade é como uma média da imagem entre os atributos do observador e os atributos do objeto observado.

Em outras palavras, o observador percebe algo de certa maneira porque é assim que ele é formado, comparado à qualidade real do mundo. Essa abordagem afirma que existe uma relação entre o individuo e o mundo, no sentido que o observador influencia a imagem do mundo que ele percebe.

A diferença entre a segunda e a terceira abordagem é a seguinte: a segunda abordagem declara que nós não afetamos o mundo, e que a imagem do mundo muda aos nossos olhos porque nós mudamos. Entretanto, a terceira abordagem declara que nós afetamos o mundo, que a nossa percepção do mundo é uma combinação das qualidades do individuo e aquelas do mundo. Atualmente, alguns proclamam que existem infinitas possibilidades, e que o observador “escolhe” qual delas perceber, de acordo com os seus atributos.

Esta ultima abordagem é a mais próxima da abordagem Cabalística. A diferença fundamental entre elas está na definição da “existência do mundo”. Afirmar que o mundo possui infinitas formas possíveis baseia-se na teoria de que se eu agir de um determinado modo o mundo “reagirá”.

A abordagem Cabalística declara que o mundo é totalmente abstrato; ele não assume forma alguma, seja ela qual for. Não existe nada fora de nós, apenas a Luz abstrata e imutável. Mesmo quando nós mudamos em relação à Luz e percebemos um pouco Dela, nenhuma mudança é causada na Luz propriamente dita. Tudo que nós percebemos é nossa medida de congruência interna com a Luz, nada mais.

De tudo que nós temos dito até agora podemos ver que a nossa vida real é muito diferente daquilo que percebemos. A imagem da realidade para cada um de nós depende totalmente dos nossos atributos internos. Esta imagem é formada de projeções dos nossos próprios atributos sobre a Luz abstrata.

Na verdade, o fato de que nossas vidas são uma conseqüência natural do que acontece dentro de nós, traz implicações profundas: todos os processos que experimentamos, incluindo a vida e a morte, são resultados diretos das percepções dos nossos vasos. Além disso, depende de nós a mudança dessas percepções. A mudança em nossos vasos permitirá com que passemos de mundo para mundo e de realidade para realidade. Assim, nós poderemos alcançar o nível mais alto de existência, onde estamos totalmente incorporados na Luz abstrata.

 

Experimentando Ein Sof (Infinito)

A única diferença entre os vasos que percebem a realidade corpórea daqueles que percebem a realidade espiritual está na intenção. Os vasos corpóreos são egoístas e os vasos espirituais são altruístas. A intenção está relacionada à nossa atitude em relação ao uso que fazemos de nossos desejos.

O único estado que realmente existe é o estado de Ein Sof (Mundo Infinito). Nesse estado, a Luz está presente dentro do Kli. Todavia, esse estado está oculto e esse ocultamento nos impede experimentar o estado de Ein Sof. A intenção altruísta remove gradualmente esse ocultamento e expõe a Luz que preenche de forma permanente o Kli.

Se nós tivermos em mente essa imagem, lembraremos que nunca revelamos qualquer Luz fora do vaso. Quando os Cabalistas dizem que as Luzes entram e saem dos vasos, eles querem enfatizar como nós nos aproximamos da realização do estado constante. Em termos Cabalísticos, Ein Sof é  o estado de “repouso absoluto”, isto é, imutável. O nosso trabalho é preparar gradualmente nossas ferramentas de percepção, de modo a percebermos esse estado. Assim, a única mudança está na nossa capacidade de perceber.

Quando a Luz “veste” a pessoa, e a pessoa sente como a Luz entra de forma gradual, o estado constante torna-se gradualmente mais nítido à medida que a pessoa desperta para senti-lo. A Luz, na verdade, nunca entra ou sai. Ela apenas fica mais evidente e evidente, isto é, mais revelada e menos oculta.

À medida que a Luz torna-se mais evidente no Kli, ela nos mostra que, na realidade, estamos no mundo de Ein Sof, no estado constante, e que devemos descobrir que este é o nosso único estado de existência. Desse modo, a Forma Abstrata não existe. A Luz que criou o Kli, preencheu-o imediatamente. Não existe intervalo de tempo entre a criação do Kli e seu preenchimento. Quando os Cabalistas dizem que a Luz emana do Criador, eles querem dizer que já existe o Kli que é preenchido por Ela.

Não devemos nos esquecer disso, que diferente da nossa linguagem relacionada com o tempo, não existe tempo na espiritualidade. É por isso que dizemos que o Kli foi primeiro criado e depois preenchido. Mas na espiritualidade, essas fases são simultâneas: o princípio e o fim ocorrem no mesmo instante.

Portanto, a Forma Abstrata realmente não existe, visto que a Forma, ou Luz, já está revestida no vaso. A nossa imaginação pode separar a Luz do Kli. Nós também podemos supor que a Luz dentro do Kli provavelmente exista fora do Kli, apesar de não termos a percepção do que está fora do Kli.

Vamos tentar demonstrar esse conceito: suponha que exista um Kli no qual eu percebo toda a realidade. Suponha também, que exista outro Kli onde eu percebo algo dessa realidade, e mais um Kli em que eu não possa perceber nada. Corrigir meus vasos refere-se à expansão dos meus vasos, dos menores aos maiores, e muito mais. Se eu digo que a Luz preenche meu vaso, isso não significa que Ela não o preencheu anteriormente, mas que agora eu descobri essa realidade de fato.

Nós podemos comparar esse processo a um paciente inconsciente que readquire a consciência lentamente. Seus parentes e amigos o cercam, esperando que ele acorde. Assim que abre lentamente os olhos, ele começa a reconhecer sua situação. Da perspectiva do paciente, a realidade “veio até ele”, e preencheu seus vasos de sensação, pois nós medimos tudo da perspectiva do receptor.

O termo Ein Sof, não se refere a nada fora das criaturas. Ele se refere ao Pensamento da Criação. A Forma final das criaturas já está presente no Pensamento da Criação. Todas as criaturas, sem exceção, já estão nesse estado com todos seus sentimentos. Portanto, o nosso estado atual é portanto chamado de “estado imaginário”. Nós somos esse paciente inconsciente; pensamos que existimos de certa maneira, e estamos gradualmente despertando para perceber a realidade atual. No fim do processo, toda criatura estará totalmente consciente de sua verdadeira condição.

Em sua Introdução ao Livro do Zohar, o Baal HaSulam descreve três estados que as almas experimentam no seu processo de despertar para o seu verdadeiro estado. O primeiro estado é o começo da Criação e contém tudo que mais tarde se desenvolverá. O segundo estado é o nascimento das almas. O terceiro estado é quando as almas obtêm o que já estava presente no primeiro estado. Em outras palavras, o primeiro estado refere-se à existência potencial das almas; no segundo, elas estão inconscientes, e no terceiro elas retornam ao seu estado original.

Nós estamos acostumados a um “modus operandi’ (modo de ação) no qual primeiro nós decidimos fazer alguma coisa, depois executamos nossa decisão, e obtemos o resultado planejado no fim da execução da nossa decisão. Contudo, o Criador é completo. Desta forma, para Ele não existe diferença entre a decisão e a execução. O conceito de tempo não se aplica ao Criador. É por isso que nós dizemos que no Pensamento da Criação fazer o bem às Suas criaturas, no começo, no meio, e no final estão integrados de forma inseparável. Apenas a nossa percepção é que divide esse Pensamento em três camadas.

O conceito de tempo se aplica às criaturas porque nós não estamos corrigidos. Existem três estados para nós: (1) corrupção, (2) preparação para a correção e correção, (3) equivalência de Forma, e preenchimento. Esta seqüência de ações cria a nossa sensação de tempo.

À medida que as Reshimot emergem em nós, elas nos fazem querer e pensar em várias coisas. Quando as Reshimot mudam, meus pensamentos também mudam. A diferença entre o meu pensamento de um minuto atrás e o meu pensamento atual cria a sensação de que o tempo está passando. Quando nossos pensamentos e desejos mudam lentamente, sentimos que o tempo está se “arrastando”. Inversamente, quando novos pensamentos e novos desejos emergem rapidamente em nossa mente, sentimos que o tempo esta’ “voando”.

Ao adquirirmos o primeiro nível espiritual, nós sentimos que estamos num processo espiritual, isto é, num tempo espiritual. Nesse estado, nós não sentimos mais o tempo corpóreo e nos identificamos complemente com o processo espiritual, onde o tempo é medido pelas mudanças e ações relativas ao nosso contato com o Criador.

A freqüência desse vaivém de “sinais”, de nós (agora Cabalistas) até Ele, cria a sensação de tempo. Isso não é mais uma questão do número de anos que passamos em nosso corpo físico. Quando todas as Reshimot emergem, elas são corrigidas e preenchidas com todas as Luzes, a alternância de estados acaba. Como não existem mais deficiências para se preencher e nós estamos num estado de perfeição, as sensações de tempo, espaço, e movimento, também acabam.

 

Para Construir Uma Casa

A compreensão da formação da Criação pode ser simplificada através de um exemplo: uma pessoa que deseja construir uma casa, primeiro vai imaginá-la na forma final. Depois, ela deve, cuidadosamente, planejar os estágios e, então, executá-los.

Isso não ocorre com o Criador. No minuto em que o Criador pensou em criar as criaturas, isso foi feito, e elas surgiram na sua forma corrigida. Desse modo, da perspectiva do Criador, estamos na nossa forma corrigida. Não faz diferença que descubramos nossa verdadeira condição de forma gradual.

Por isso, quando nós queremos receber força, nos dirigimos ao estado de Ein Sof (Infinito), que chamamos de “Criador”. Para receber força e discernimentos, nós nos dirigimos à realidade corrigida, onde já existimos, e que devemos almejar. Ein Sof é o Pensamento (ou Idéia), e o  mundo de Atsilut é o projeto detalhado: estas são as duas fases que precedem a execução do Pensamento. Isto se parece com o modo como a pessoa pensa quando constrói uma casa ou  mesmo quando coloca suas idéias no papel sem ter os materiais.

Abaixo do mundo de Atsilut está o Parsa, a separação entre Atsilut e o mundo abaixo dele. As criaturas começam do Parsa para baixo. No entanto, o Criador não tem que esperar pelas ações das criaturas. Para Ele, o Pensamento e o Projeto são a totalidade da realidade. Abaixo do Parsa estão os mundos de Beria, Ietsira, Assia, e abaixo deles está Este Mundo (Figura 14).

Figura 14

A Luz desce do mundo de Atsilut para baixo de acordo com o desejo de cada pessoa de “construir a casa”. Este desejo, que a pessoa eleva em direção à Luz, é a sua intenção de agradar ao Criador e assemelhar-se a Ele. Em outras palavras, é a intenção de obter a equivalência com o Criador.

O processo de doar ao Criador consiste de um princípio e um fim. Não só o começo e o fim pré- existem, mas também cada um dos estágios intermediários. A pessoa sabe antecipadamente os estágios que deve passar, porque conforme o projeto, a definição prévia de cada estágio origina-se do Kli ter que se submeter a uma correção gradual.

Existem diversos desejos no Kli, os quais estão todos interconectados. Eles podem ser comparados aos órgãos de um corpo, onde a cada órgão é solicitado que desenvolva a intenção de doar. A correção de um desejo influencia todos os outros, que devem se desenvolver em seus devidos lugares na ordem de correção. Não existe nada na vida de uma pessoa que não seja pré- determinado pela estrutura do desejo de receber, do mesmo modo que o caminho da correção é predefinido e dividido em ordens predeterminadas.

Nós estamos sempre num estado perfeito, mesmo agora. À medida que as Reshimot  emergem e nos colocam em situações variadas, tudo que fazemos é perceber cada uma delas. Não podemos escolher as situações que vamos experimentar, mas podemos ser assistidos pelo ambiente de modo a perceber os estágios de forma mais efetiva. Dessa maneira, avançaremos de uma situação para a outra.

Além disso, até a maneira com a qual percebemos os estados em que nos encontramos é predeterminada. Nada é novo na perspectiva do Criador; isso só está oculto de nós para que possamos escolher nos desenvolver espiritualmente de forma independente. Depois, quando isso não afetar mais os nossos esforços, descobriremos que nossos sucessos e fracassos em atingir esses estados também eram pré-determinados. Quando isso ocorrer, estaremos absolutamente integrados na orientação perfeita do Criador.

Se nós nos corrigíssemos além do nosso interesse nos resultados que sentimos em nossos vasos, não seríamos mais influenciados pelo que acontece no início, meio e fim. Semelhante ao Criador, o início, meio e fim seriam igualados em nós, tornando-se um só estagio. É por isso que aqueles que se corrigem transcendem o tempo e o efeito dos estágios temporários. A correção que devemos realizar consiste essencialmente em nos desligarmos de nosso auto-interesse.

Nós podemos definir a criatura como “algo” que sente a si mesmo separado do Criador, e que está aparentemente em seu próprio direito. Do ponto de vista da criatura, a casa ainda não está terminada. A criatura sente que pode contribuir com alguma coisa na construção dela.

Quando a criatura começa a querer descobrir o projeto com o intuito de completar a construção da casa, considera-se que ela voltou a Ein Sof por si mesma. Esse esforço de buscar conselho e força para entender o projeto do Criador e percebê-lo, traz à criatura uma familiaridade constante e profunda com o plano, e à subseqüente inclusão na casa terminada.

Todavia, esse processo se desenvolve exatamente quando a criatura está aparentemente adicionando cada parafuso, prego, tijolo e cimento na construção. Essa adição, constitui o desejo da pessoa de estar incorporada na casa, e não a construção real dela. O material bruto, os metais, a madeira, e os tijolos, são os desejos. A pessoa só precisa querer colocar cada desejo no seu devido lugar, de acordo com o Plano do Criador. Ao construir uma casa feita de desejos, a pessoa adquire o Pensamento do Criador. Esta é a recompensa da criatura.

O Pensamento da Criação só pode ser alcançado nesse mundo. Enquanto existe neste mundo, o Cabalista estuda gradualmente as ações do Criador diretamente d’Ele, e começa a querer fazer o mesmo. Os Cabalistas chamam esse processo “de suas ações nós o conhecemos”. O resultado desse processo é a obtenção da Mente do Criador, o Seu Pensamento.

O Pensamento do Criador precede a criação da criatura. Desse modo, ao obter isso, a pessoa não somente retorna ao local de seu nascimento, como também se eleva ainda mais, transcendendo o nível de “criatura” e alcançando o nível real do Criador. Nesse ponto podemos dizer que eles são uma só mente, em adesão, ou equivalência de Forma.

Para ser exato, o projeto surge no primeiro contato com a espiritualidade. Isto porque cada nível espiritual é uma estrutura completa de dez Sefirot. O material do prédio, sua estrutura, mesmo o seu construtor, tudo se torna conhecido com o surgimento da primeira imagem.

Depois da admissão no mundo espiritual, a pessoa torna-se muito mais familiarizada com a sua estrutura, porque a espiritualidade é construída somente com o consentimento dela, em todos os passos do processo. O consentimento pertence à intenção da pessoa de doar, a intenção altruísta. A independência e a liberdade escolha da pessoa, o seu “local de trabalho”, está em concordância com a intenção altruísta. Este é o acréscimo que o Criador nunca acrescentou, nem pode acrescentá-lo.

O Mundo de Ein Sof é a casa que o Criador dá à criatura com tanto amor, mas a pessoa deve devolver o mesmo amor a Ele; ao fazer isso, ela aparentemente constrói a mesma casa para o Criador. Desse modo a criatura devolve as ações do Criador, iguala-se a Ele e, conseqüentemente, eleva-se ao Pensamento da Criação.

 

Os Mundos Estão Dentro

Os Mundos Superiores e seus níveis existem somente em relação a nós, não neles mesmos. Os mundos existem em potencial, esperando que nós os corrijamos e descubramos suas formas espirituais. Nesse estado, nós seremos imediatamente apresentados com todos os níveis entre nós e Ein Sof, começando com o próximo nível adjacente.

Uma carga elétrica num campo magnético “sente” a influencia do campo sobre ela e, desse modo, “sabe” que esse campo existe. Se a carga não estivesse dentro do campo, ela não teria “sentido” o efeito do campo magnético; de fato, ela nem saberia que o campo existe.

Igualmente, quando deixamos a atmosfera da terra, descobrimos que o espaço distante e’ escuro. Isso pode soar estranho , considerando que os raios solares se espalham através do espaço, mas se não existe nada que fique no caminho desses raios e os “capte”, não poderemos detectar a existência dessa luz.

Outro bom exemplo desse principio pode ser observado quando nós assistimos à luz solar entrar num quarto por uma janela aberta quando existe alguma poeira no ar. Nós só podemos detectar os raios por seus reflexos na poeira do ar. Em outras palavras, se a criatura não sente nada, ela não pode dizer existe algo lá fora. Em tal estado, nós dizemos que tudo que existe é o Pensamento da Criação, que deseja fazer o bem para aquilo que foi criado.

A criatura, que está em Ein Sof, descobre Ein Sof de acordo com sua relativa correção ou corrupção. O grau de intensidade no qual ela sente a Luz em cada nível espiritual, de Ein Sof até a criatura, só depende dela mesma. Por essa razão, nós dizemos que todos os mundos estão dentro de cada criatura, e somente depois de percebermos certas partes do Pensamento da Criação nos tornamos cientes da existência desse Pensamento. Nós não podemos falar de Criador, realização ou satisfação, quando isso não vem de dentro do individuo realizado, isto é, se não há Kli, não há Luz. Em outras palavras, sem a criatura não existe o Criador.

 

Acelerando o Desenvolvimento

A Luz de Ein Sof preenche toda a realidade e todo desejo de receber que Ela criou. Ela age dentro dele para fazê-lo igualar sua forma com Ela. A pressão da Luz no desejo de receber é constante, imutável em quantidade e na qualidade. Como conseqüência, mudanças permanentes se revelam no desejo de receber, que nós chamamos de “providência geral”. Como essa atitude é permanente e imutável, ela é chamada de “o Ein Sof que está em repouso absoluto”.

O termo “Ein Sof” enfatiza que o Criador é imutável e que o Seu propósito é também imutável: levar a criatura ao Gmar Tikun (Fim da Correção). O progresso em direção ao Gmar Tikun é realizado através da pressão da Luz sobre o Kli, que no final fará com que Kli sinta que está em contradição com o estado da Luz.

Por causa da pressão que isso causa, os Cabalistas se referem a esse caminho como “o caminho da dor”. Enquanto nós trilhamos esse caminho, tudo acontece no devido tempo, a pressão constante da Luz no Kli induz a formação de muitas formas no Kli até que elas são exauridas e o Kli alcança seu Gmar Tikun.

No final da evolução natural do desejo de receber nos humanos, depois de muitos ciclos de vida, a pessoa começa a sentir que existe algo superior, um Doador. Nessa fase, ela começa a acumular discernimentos que não pertencem ao desejo de receber, mas ao desejo de doar que se infiltrou no desejo de receber na quebra dos vasos.

Em tal estado, a pessoa está entre duas forças: o desejo de doar e o desejo de receber. Tal estado permite que a pessoa acelere o seu desenvolvimento e progrida mais rápido do que a pressão natural da Luz sobre o Kli permitiria.

Todavia, a aceleração da evolução em direção aos atributos da doação não pode ser feita de dentro do ego da pessoa. O único jeito de adquirir o atributo da doação é recebê-lo do  Criador.  O trabalho do indivíduo é achar um jeito de receber a Forma da doação “do Alto”, sem experimentar totalmente os infortúnios no Kli, os quais forçariam o indivíduo a fugir da recepção para a doação pela dor e o sofrimento.

A escolha desse caminho é chamada de “evolução de baixo para cima”. Nela, nós caminhamos em direção à pressão da Luz e sistematicamente atraímos sobre nós todos os estados, um por um. Tomando esse caminho, nós queremos progredir em direção ao Criador, em direção à aquisição da Forma de doação, e ao fazê-lo, nós escapamos dos outros estados.

O grande benefício desse caminho alternativo, chamado de “caminho da Luz”, é que a pessoa experimenta os mesmos estados, todo e qualquer desejo, e sua oposição ao Criador, mas não devido à pressão da Luz por trás, mas devido ao anseio pela Luz. Esse caminho permite que a pessoa experimente rapidamente o discernimento necessário e de uma maneira mais controlada. O caminho da Luz é como descobrir que nós estamos doentes, e tomar o remédio adequado antes da doença piorar. Por isso, o nosso próprio anseio pode nos poupar grandes sofrimentos e problemas.

Se nós formos atraídos pela Luz por nossa própria iniciativa, isto é, pelas Formas de doação acima do desejo de receber, nós escaparemos de muitas aflições. É por isso que a sabedoria da Cabala foi dada ao ser humano. Sem ela, a humanidade progrediria de forma natural, passo a passo, cada fase durando até que sua negatividade fosse totalmente exposta, e fôssemos forçados a entrar no próximo estado. Ensinar a sabedoria da Cabala, e como usá-la para atrair a Luz, nos ajudará a evoluir de um jeito muito diferente, de forma agradável e rápida.

 

Construindo o Criador Interiormente

Como já havíamos explicado antes, todas as mudanças se revelam dentro de nós, apesar delas parecerem estar ocorrendo fora de nós. Nós devemos entender que sem experimentar que as mudanças estão ocorrendo fora de nós, nos não seríamos capazes de fazer contato com o Criador ou mesmo pensar que o Criador existe ou tem qualquer relação conosco. É exatamente essa ilusão que nos possibilita perceber a Luz como algo que existe fora de nós.

Quando nós relacionamos o que acontece dentro de nós com a existência de um Criador externo, nós podemos construir uma atitude em relação a isso e entender quem é o Criador e como Ele quer doar para nós. Se nós não relacionássemos nossas experiências internas ao Criador, não conseguiríamos perceber nada Dele. Além disso, teríamos sido incapazes de construir a intenção de doar ao Criador.

À medida que nós nos desenvolvemos, nós construímos gradualmente uma imagem verdadeira do Criador. No final do processo de construção nós alcançamos a Luz Simples, o Doador, O Bem Supremo, Aquele que esta num estado de amor eterno e imutável.

A sensação ilusória de que existe uma conexão entre o Criador e a criatura muda de acordo com as mudanças na criatura. Isto permite que a pessoa imagine o Criador de acordo com o seu próprio atributo. De fato, ao fazer isso, a pessoa constrói o Criador interiormente; não existe outra forma de sentir o Criador.

Projetar os atributos da pessoa sobre a Luz abstrata ilumina o nível acima do nível atual da pessoa, que é o nível que a pessoa imagina como o Criador. Por isso, nós atribuímos o nível logo acima do nosso, que atingiremos depois, como o Criador. Uma vez que nós alcançamos a equivalência com os atributos de doação naquele nível, “tomamos” o lugar do Criador. Agora, essa pessoa está no lugar onde o Criador estava antes (aos nossos olhos).

Assim, à medida que evoluímos, nós sempre imaginamos o próximo nível através de nossas qualidades corrompidas. Nós construímos a imagem do Criador, à qual aspiramos nos tornar, em relação às nossas próprias qualidades. Essa é a única maneira de nós percebermos qualquer Forma do Criador, a única maneira de nos aproximarmos da Luz abstrata.

Esta sensação imaginária nos ajuda a construir o nível atual e também o próximo. Ela facilita o nosso entendimento para onde devemos nos voltar quando queremos reunir forças. Apesar disso se revelar interiormente, a imagem do Criador que nós construímos demonstra a diferença entre nosso estado atual e o próximo. Desse modo, nós percebemos a diferença entre o Criador e nós. Esta é a única maneira de aprendermos o que está Acima, pois o Criador não tem uma Forma que possamos perceber. Por essa razão, nós construímos o Criador dentro de nós.

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