Capítulo 2: O NÚCLEO DOS DESEJOS

Do livro “Interesse Próprio vs. Altruísmo na Era Global”

A importância da descoberta de Abraão não reside tanto em sua inovação científica ou conceitual, embora, em seu tempo, ambas tenham sido absolutamente radicais. Em vez disso, o principal significado de sua descoberta reside no seu aspecto social.

Na verdade, a motivação de Abraão para fazer as perguntas que no final levaram a sua descoberta foi tanto social como intelectual. Ele notou que o povo da cidade estava se tornando cada vez mais alienado. Por um longo tempo, os babilônios nutriram uma sociedade próspera que permitiu que vários sistemas de crenças e ensinamentos coexistissem em harmonia. No tempo de Abraão, porém, as pessoas estavam ficando intolerantes, vaidosas e alienadas umas das outras, e Abraão perguntava-se por quê.

A partir de suas perguntas e observação da natureza, ele percebeu que o mundo que aparece aos nossos sentidos é apenas uma cobertura superficial que cobre uma interação complexa e magnífica de forças. Quando essas forças se entrelaçam de certa forma, induzem determinado tipo de realidade física ou emocional a aparecer, tais como nascimento, morte, guerra, paz e todos os estágios que permeiam isso. Essa interação não existe apenas em grande escala como entre os países, mas em cada elemento da vida, desde o subatômico até o interestelar, desde o pessoal ao internacional. Na última parte deste livro vou explorar as implicações sociais das descobertas de Abraão, mas para isso precisamos entender mais acerca da natureza das descobertas em si mesmas.

O processo de pensamento de Abraão para descobrir essas forças é evidente em suas perguntas, que para ele foram, como Neil Postman coloca em O Fim da Educação, “os principais instrumentos intelectuais disponíveis para os seres humanos.”38 Nos escritos de Maimônides, Abraão pergunta: “Como foi possível para esta roda [da realidade] sempre girar sem condutor? Quem a está movendo, já que não pode girar sozinha?”39 Mais tarde, suas percepções ajudaram a derrotar Nimrod no debate, quando Nimrod continuava lhe ordenando que servisse este ou aquele elemento, e Abraão continuava mostrando-lhe que esses elementos eram todos ramos de algo maior, sem poder real em neles próprios.

“Assim, a partir de repetidas reflexões e observações, Abraão percebeu o que realmente faz o mundo girar” e, como todas as grandes verdades, era muito simples: desejos, dois desejos, para ser exato. Um deles é o desejo de doar e o outro, o desejo de receber. “A interação entre esses desejos é o que faz o mundo girar”, é a roda que move todas as coisas e a  força que cria todos os fenômenos.  Na terminologia cabalística,  o  desejo de doar é referido  como  “Seu desejo  [do  Criador] de fazer o  bem a Suas criações”40, e  o desejo de receber é descrito como “o desejo de receber deleite e prazer”41. Para encurtar, os Cabalistas se referem a eles como “desejo de doar” e “desejo de receber”.

Essa constatação simples é o que Abraão estava tentando transmitir a seus colegas babilônios, mas Nimrod procurou impedi-lo de fazer isso ao tentar matá-lo. E quando não conseguiu o que queria, mandou-o embora.

Infelizmente, com a deportação de Abraão, o espírito de camaradagem e união da Babilônia não foi restaurado. Finalmente, “O Senhor [Criador, Natureza] confundiu a linguagem de toda a terra e dali o Senhor os espalhou sobre a face de toda a terra” (Gênesis 11:9).

Isso não aconteceu aos babilônios, porque um vingativo e poderoso velho homem chamado “O Senhor” nutria rancor contra eles. Isso aconteceu a eles, porque os desejos que Abraão descobriu possuíam determinado sentido de evolução. Não há interação aleatória aqui, mas um conjunto de regras que se desdobram por uma ordem rígida de causa e efeito.

Quando Abraão descobriu essas regras, percebeu que seu povo local estava indo na direção errada, o que só poderia levá-los à futura destruição, por isso ele tentou o seu melhor para avisá-los. Como veremos, esses desejos são tão perpétuos e tão rígidos quanto a gravidade ou os polos positivo e negativo de um ímã. Como a gravidade e os polos do ímã, porém, ambas as forças podem ser usadas para trabalharem em nosso benefício.

Para entendermos a semelhança entre o estado atual da humanidade e o estado da sociedade babilônica e, portanto, a relevância da descoberta de Abraão para a crise global da atualidade, precisamos entender a direção em que os dois desejos evoluíram.  E para isso precisamos começar pelo início.

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