Big Bang

Do livro “Interesse Próprio vs. Altruísmo na Era Global”

O tempo, como nós o conhecemos, começou há aproximadamente quatorze bilhões de anos. Da perspectiva espiritual cabalística, o “big bang” foi a quebra da alma de Adão. A razão por vermos isso como um evento material é porque vemos o mundo com olhos corporais (egocêntricos). Se pudéssemos ver da perspectiva da força que induziu essa explosão massiva a que chamamos “big bang”, veríamos isso como resultado da tentativa de Adão de receber, usando o último e maior de todos os desejos,  como descrito no capítulo anterior.

Os Quatro Estágios em Questão

Assim como os desejos originais evoluíram em estágios, seus paralelos mundanos apareceram e foram corrigidos um de cada vez, do mais fácil ao mais  duro.  Agora, como cada desejo manifesta-se em nosso universo, a Natureza, que, como falamos no Capítulo 1, é sinônimo de Criador, deve “ensiná-lo” a trabalhar de modo a contribuir para o bem estar e a sustentabilidade do universo.

Para realizar isso, a Natureza aplica um método muito similar ao principio de seleção natural de Darwin. De fato, muitos dos principais estudiosos agora reconhecem a existência do processo de seleção natural em um período anterior ao advento da vida na Terra. O professor Ada Yonath, Prêmio Nobel em Química, fez a seguinte afirmação em uma convenção internacional que celebrava o 150° aniversário da publicação de A Origem das Espécies, de Darwin: “A sobrevivência do mais apto e a seleção natural desempenharam   um   papel   importante   do   mundo   pré-biótico,   mesmo   que essas qualidades estejam relacionadas primariamente à evolução das espécies.”xix

Assim como no principio de seleção natural de Darwin, o mérito de qualquer novo desenvolvimento na Natureza é julgado por sua contribuição à sustentabilidade de seu beneficiário. A diferença entre o princípio darwinista e o cabalista é o beneficiário: na teoria clássica de Darwin, os beneficiários são as espécies; na Cabalá, o beneficiário é a Natureza — o todo da Natureza, significando o Criador.

Se esse conceito soa um pouco artificial, pense em espécies como parte de um ecossistema. Na biologia contemporânea, é comum ver uma espécie em relação a seu meio ambiente, em vez de independente dele. E uma vez que sabemos que todos os ecossistemas estão interconectados, é fácil entender que um distúrbio em um sistema pode e irá afetar adversamente os demais sistemas do planeta.

Talvez a melhor descrição que eu tenha ouvido até hoje, explicando como a Natureza muda seus elementos de receptores do ambiente em doadores, veio da biólogia evolucionista Elisabet Sahtouris, PhD. Em uma conferência em Tóquio, em novembro de 2005, a Dra. Sahtouris afirmou: “No seu corpo, cada molécula, cada célula, cada órgão e todo o corpo têm interesse próprio. Quando cada nível (…) mostra seu interesse próprio, ele força negociações entre todos os níveis. Esse é o segredo da Natureza. A cada momento em seu corpo, essas negociações levam seu sistema à harmonia.”

Claramente, o equilíbrio e o bem estar de todo o sistema são imperativos para a sobrevivência do corpo humano. Por isso o equilíbrio é tão imperativo para a sobrevivência de cada um dos sistemas do corpo. Hoje, a visão da Natureza como um sistema e não como uma coleção de elementos separados vem ganhando terreno entre os principais pesquisadores. Isso levou ao surgimento de campos da ciência tais como ecologia, cibernética, teoria de sistemas e complexidade.

Como vimos, a Cabalá sempre considerou toda a Natureza como uma unidade única. Essa totalidade não se aplica apenas à Terra e à vida sobre ela, mas ao universo inteiro — à parte corporal e também à espiritual.

Assim, as mesmas regras que se aplicam ao mundo espiritual — o mundo do altruísmo — se aplicam a nosso mundo corporal — o mundo do egoísmo. A diferença entre nosso mundo e o espiritual é que os desejos do mundo espiritual são todos sobre doação, enquanto nós somos descendentes da quebra de Adão. Como tal, somos inerentemente egocêntricos, às vezes a ponto de esquecermos o que somos de fato.

E porque estamos tão absortos em nós mesmos, ficamos alheios aos fatos que ocorrem em níveis mais profundos, a Natureza é governada por regras altruístas. O papel da Cabalá é descobrir essas regras e apresentá-las como uma forma de entendermos nosso mundo e administrá-lo em um novo nível de consciência. Por essa razão, tudo o que doravante discutiremos, da formação do universo à correção das relações humanas, derivarão e dependerão do conceito de evolução dos desejos, que expliquei até agora.

Inanimado

Depois da quebra de Adão, cada parte do desejo de receber começa a se sentir independente, separada de seu ambiente e desejando absorver dele. Esse desejo de absorver, essa força de atração ou gravidade — o paralelo físico do desejo de receber — formou os primeiros aglomerados do universo, que depois se tornaram a substância das primeiras galáxias do universo.

Com espaço e campo de gravidade surgiram formas mais estruturadas do desejo de absorver (ou seja, do desejo de receber), e as partículas apareceram. O processo de absorção continuou, e as estrelas nasceram com planetas ao seu redor. Dessa forma, a gravidade, a  força  mais  fraca da  Natureza, criou a  infraestrutura do  universo  inteiro, assim como o Estágio Um, o mais fraco desejo de receber, criou a infraestrutura para os Quatro Estágios e todos os mundos espirituais que se seguiram.

Como no Estágio Um, o desejo de receber no corporal inanimado consiste basicamente no desejo de assegurar sua própria sobrevivência, sustentar a si mesmo. Sua  única relação com os outros é que ele resiste a qualquer tentativa de quebra, dissolução ou mudança. Ainda, como resultado do nível inanimado e sua aspiração por manter sua própria sobrevivência, algumas partículas “descobriram” que elas poderiam assegurar melhor seu futuro, colaborando com outros elementos.

Contrariamente à teoria da evolução de Darwin, a Cabalá afirma que não há coincidência. Na realidade, as partículas não “descobrem” ou por acaso colaboram e subsequentemente se beneficiam ao fazê-lo. Isso implicaria que a Natureza não tem propósito, é randômica, e que não há meta pré-determinada no final do  processo. Em vez disso, Baal HaSulam explica (em “Prefácio à Sabedoria da Cabalá”xix, Estudo das Dez Sefirotxix e outros lugares) que, sendo o nosso mundo o último em uma série de eventos de causa-e-efeito, o desejo que aparece em nosso mundo já contém (embora não conscientemente)  reminiscências  dos  estados  anteriores,  uma  vez  que  eles  são suas

ramificações. Por isso, o desejo de receber neste mundo já contém reminiscências dos Quatro Estágios, o Partzuf, e todos os mundos espirituais. Como  resultado,  a preparação, a configuração para a descoberta dos benefícios da colaboração existe previamente em todos os níveis de desejo neste mundo. É isso que lhes permite “miraculosamente” descobrir os benefícios da “negociação em harmonia”, como coloca Sahtouris.

Muitos físicos concordam que as partículas não necessitam de muito tempo para “descobrir” os benefícios da colaboração. Uma publicação do Observatório  de Haystack, um centro de pesquisas do MIT, explica: “Quando o universo tinha 3 minutos de idade, ele já havia resfriado o suficiente para que prótons e nêutrons se combinassem em núcleos.”xix Para se desenvolver ainda mais, no entanto, tiveram de forjar colaborações adicionais, que se manifestaram na forma de elétrons, e equilibraram a carga positiva do núcleo. Assim foi como os primeiros átomos apareceram.

Para essas partículas, ser parte de um átomo ─ diminuindo, portanto, seu interesse próprio em favor do interesse do átomo ─ era toda a correção de que necessitavam. Agindo para o bem do sistema e não para seu próprio bem, deixaram de estar centradas em si mesmas e começaram a se centrar no sistema. Elas se tornaram “conscientes” do seu ambiente e de como poderiam contribuir com ele. Assim, elas se tornaram “altruístas”, embora pela razão egoísta de perpetuar sua própria existência.

A “recompensa” das partículas que primam em doar para o seu ambiente é a criação de um ambiente forte, resultando em átomos estáveis. E isso garante a  sua  existência futura.

Além disso, como os átomos precisam de todas as suas partículas para se manter, internamente eles protegem suas partículas. Dessa forma, abdicando do  interesse próprio em prol do interesse de seus átomos, as partículas angariam o  interesse de todo o sistema no bem estar desses átomos. Esse “acordo” provou ser tão bem sucedido, que, “Momentos depois do Big Bang, prótons e nêutrons começaram a se combinar para formar o hélio-3 e outros elementos básicos”, disse Robert Rood, da Universidade da Virgínia, conforme citado em um comunicado da Rádio Nacional do Observatório de Astronomia.xix Assim os primeiros minerais surgiram.

O corpo humano é possivelmente o exemplo mais vívido do modus operandi de abdicar do interesse próprio em benefício do interesse do sistema hospedeiro, recebendo em troca a proteção desse sistema. No corpo humano, assim como em qualquer organismo, cada célula tem uma função específica. Para o organismo sobreviver, cada célula deve desempenhar sua função com o melhor de suas habilidades e substituir a meta de manter sua própria vida pela meta de manter a vida do seu organismo hospedeiro.  Se uma  célula começar a agir contrariamente a esse princípio, seus interesses logo irão conflitar com os do corpo, e os mecanismos de defesa do corpo irão destruí-la. Assim, é provável que se origine um tumor de células insubordinadas, que lutam para consumir os  recursos do corpo em seu próprio benefício. Quando esse tipo de processo ocorre, nós o diagnosticamos como “câncer”.

Se o câncer vencer, o corpo morre e o tumor morre junto com ele. Se o corpo vence e o câncer morre, o corpo sobrevive com as células do corpo que não se tornaram malignas, e as células egoístas são extintas. Esse é o mecanismo de segurança contra falhas com o qual a Natureza assegura que sistemas egocêntricos não existam. Aqui, também, não há nada de milagroso, simplesmente os mecanismos egoístas invariavelmente se  consomem até a extinção, porque consomem sua fonte de alimento.

Por conseguinte, é interesse de todas as células do corpo curar o tumor. Colocado de outra forma, garantindo a sobrevivência dos elementos do sistema,  os  elementos naquele sistema promovem o bem estar do sistema antes de prover seu próprio bem estar. Em troca, o sistema irá prover o bem estar deles e garantir sua sobrevivência.

O princípio que acabamos de explicar não é válido apenas para partículas, átomos e organismos, mas para toda a vida. Aplicando-o, todos os elementos da Natureza aprendem a trocar sua natureza egoísta por uma natureza altruísta, que considera o bem coletivo antes de seu próprio bem.

Assim, voltando ao nosso tópico de observar o universo primordial, uma vez que as partículas juntaram-se para criar átomos, átomos começaram a se unir, criando, dessa forma, as primeiras moléculas. Estas aderiram à mesma regra, e as que sobreviveram foram aquelas cujos átomos estavam fortemente conectados, assim como com os átomos, abdicando de seu próprio interesse frente ao interesse de seu sistema hospedeiro – as moléculas.

Em todo esse processo, não há liberdade de escolha. Nem átomo nem molécula podem optar por não serem criados, porque os elementos que os constituem procuram o melhor modo de formá-los para melhor proteger seus interesses. Ainda, criando moléculas, os átomos realizam algo muito mais significativo do que proteger a si mesmo  e  às partículas que os criaram. Assim como as partículas, eles construíram um sistema antes de atender a seu interesse próprio e, ao fazê-lo, os átomos se transformam de entidades auto-orientadas em orientadas para o sistema, o que significa altruísmo.

Desse modo, outra camada do nível inanimado do desejo de receber foi corrigida. E embora não haja liberdade de escolha nessa correção, o modus operandi altruístico é todo o requerido para os minerais serem considerados corrigidos. Como o Estágio Um não tem qualquer liberdade de escolha na sua evolução, também o nível inanimado não tem liberdade de escolha na sua evolução; ele simplesmente trabalha para assegurar sua sobrevivência da melhor forma possível.

Curiosamente, a teoria de Darwin reflete quase o mesmo padrão em seu princípio de seleção natural. Uma diferença entre a Cabalá e o Darwinismo é que o Darwinismo define moléculas estáveis vs. não estáveis, e a Cabalá define moléculas equilibradas vs. desequilibradas. Moléculas equilibradas apoiam os átomos que as compõem, e os  átomos igualmente apoiam suas moléculas.

Em O Gene Egoísta, Richard Dawkins — um dos mais renomados defensores contemporâneos de Darwin — descreve o processo de evolução molecular: “A mais antiga forma de seleção natural foi simplesmente a seleção de formas estáveis e a rejeição das instáveis. Não há mistério nisso. Isso tinha de acontecer por definição.”xix

As observações de Dawkins são congruentes com as da Cabalá. Na terminologia Cabalística, uma molécula estável é aquela que abdica de seu próprio interesse em favor do interesse da molécula. As “formas estáveis” de Dawkins, portanto, são sinônimos das “moléculas corrigidas” da Cabalá, nas quais os átomos se tornaram “altruístas”. Reciprocamente, nas moléculas instáveis (não corrigidas), um ou mais átomos se mantêm focados em seus interesses próprios.

Seguindo o mesmo procedimento das partículas e dos átomos, as moléculas começaram a se unir e a criar o que os biólogos chamam “interações moleculares” ou “conexões”. O mesmo aconteceu com as moléculas, interações em que as moléculas se dedicaram à força e ao bem estar das conexões prosperaram, e aquelas cujas moléculas apoiaram apenas parcialmente a conexão se desintegraram.

Existem muitas formas de interações moleculares na natureza, mas há menos de quatro bilhões de anos, uma interação em particular marcou a mudança entre o estágio inanimado na Terra (e talvez no universo) e o vegetativo. Esse agregado especial de moléculas recebeu o nome de “Ácido Desoxirribonucleico”, também conhecido como DNA (Imagem 2).


Imagem 2: Ácido Desoxirribonucleico, também chamado DNA

Nos átomos, as partículas assumem diferentes funções: alguns formam o núcleo e outras formam a parte externa ou casca, por exemplo. Similarmente, nas moléculas, os átomos assumem diferentes funções e devem aderir a formas rígidas de conexão. E finalmente, na interação molecular, cada molécula exerce uma diferente função.

Com o aparecimento do DNA, porém, as coisas começaram a mudar. O DNA não  é mais uma estrutura feita de diferentes moléculas que formam uma estrutura. Ele é uma estrutura que pode interagir com outras estruturas, e a cada estrutura é atribuída uma função diferente. Essas, combinadas, servem ao bem da estrutura. Em biologia, essas estruturas são chamadas “células” ou “organismos unicelulares” e constituem a mais primitiva forma de vida.

Pode-se argumentar que, essencialmente, esses organismos funcionam quase que da mesma maneira que os átomos, as moléculas ou as estruturas moleculares introduzidas antes. A estrutura única criada em torno do DNA, no entanto, permite que ocorram duas funções até então inexistentes: 1) O DNA é a primeira estrutura conhecida na natureza que pode replicar a si mesma, bem como replicar as estruturas moleculares que o suportam! 2) Células são as primeiras estruturas que sistematicamente interagem com seu ambiente. Elas absorvem nutrientes de seu ambiente, processam-nos para extrair a energia de que necessitam para sua sobrevivência e então excretam os resíduos. Além disso, as células podem repetir com precisão esse processo tantas vezes que podem de fato transformar seu ambiente.

Há muitas definições do que é a vida. Para ficar de um lado seguro, escolho a definição apresentada pela Enciclopédia Britânica: “Matéria que apresenta certos atributos, que incluem responsividade, crescimento, metabolismo, transformação de energia e reprodução.”xix As  primeiras células,  chamadas “procariontes”,  possuíam todos   esses atributos e representaram uma evolução direta da interação molecular. Assim, o começo da vida como conhecemos deveu-se à mesma lei pela qual todos os sistemas atingem equilíbrio e sustentabilidade — os constituintes abdicam de seus interesses próprios em beneficio do interesse de seu sistema hospedeiro, para, em contrapartida, o sistema cuidar deles.

Vegetativo

Como dissemos acima, os primeiros organismos vivos foram células primitivas, conhecidas como “procariontes”. Assim como ocorreu com os minerais na fase inanimada, os procariontes ficaram mais complexos.

A fase vegetativa na evolução da vida corresponde ao Estágio Dois. A diferença entre o Estágio Um e o Estágio Dois é que o Estágio Um é passivo — recebendo o que a Natureza lhe dá —, enquanto o Estágio Dois reage a isso, desejando dar em retorno. Similarmente, as plantas respondem ao seu ambiente e interagem com ele. Seu produto, o oxigênio, é um presente da flora para o nosso mundo e é um elemento tão vital para a vida, que, sem ele, a evolução como conhecemos não seria possível.

Em sua “Introdução ao Livro do Zohar”xix, Ashlag explica que o nível vegetativo do desejo de receber, como manifestado nas plantas, revela um desejo de receber mais intenso. Por essa razão, as estruturas criadas por ele são mais complexas e causam um impacto mais perceptível em seu ambiente.

Também, ao contrário dos minerais, as plantas são espécimes individuais, com sua própria reprodução, alimentação e até mecanismos de migração. Ainda, como os minerais, todas as plantas têm comportamento semelhante — aderindo com precisão ao programa instalado nelas pelo Criador. Elas abrem suas pétalas (se tiverem) ao mesmo tempo pela manhã e fecham-nas ao mesmo tempo à tarde, e seguem quase exatamente o mesmo procedimento de todos os outros espécimes em suas espécies.

Dessa maneira, de acordo com a lei de abdicar de seu interesse próprio, como  descrito na seção anterior, as células continuam a evoluir, produzindo estruturas cada vez mais intrincadas e complexas. Primeiramente, elas congregam células simples em grandes colônias. Então, gradualmente, começam a perceber que poderiam se beneficiar, atribuindo diferentes funções a diferentes grupos de células. Algumas células se tornam “caçadoras”, provendo alimento para a colônia inteira, outras células  se  tornam guardiãs, outras ainda se tornam limpadoras e cada grupo contribui com o seu melhor para a comunidade.

Conforme dissemos anteriormente sobre a colaboração das partículas, a colaboração dos diferentes órgãos não é coincidência. Ela se baseia em estruturas similares que existem no mundo espiritual, reino altruísta. A descrição dos mundos espirituais (altruístas) que fornecemos nos Capítulos 2 e 3 é uma versão muito básica deles. Em O Estudo das Dez Sefirotxix, Baal HaSulam fornece uma análise detalhada da estrutura interna do Partzuf que discutimos anteriormente e explica os sistemas, como o sistema digestivo, o sistema reprodutor, mãos, pernas, etc.

Baal HaSulam, entretanto, descreve todos esses elementos como interações entre o desejo de doar e o desejo de receber. Eles não são nenhum tipo de objeto físico, embora seu comportamento sirva como um “protótipo” para o comportamento de sistemas similares em nosso mundo. Em Cabalá, um protótipo é chamado “raiz”, e todos os seus desdobramentos são chamados “ramos”.

Além da vantagem óbvia que o tamanho das colônias tem sobre células individuais, retornando ao tópico da evolução, células em colônias têm outra vantagem sobre células individuais: elas podem se concentrar em uma única tarefa e assim aperfeiçoar seu desempenho, aumentando sua contribuição à colônia e confiando nas células companheiras para prover suas outras necessidades. Células isoladas, por outro lado, precisam atender a todas as necessidades de sustento por si mesmas. Essa eficiência elevada significa que as colônias gastam menos energia para produzir a mesma quantidade de comida, calor, proteção e qualquer outra necessidade. Ainda, abdicando de seu interesse próprio, as células começam a se diferenciar.

Com a evolução da diferenciação celular, maiores, mais fortes e mais diversificadas plantas apareceram. Ao permitirem que algumas células se concentrassem exclusivamente na absorção da água do solo e outras focassem a fotossíntese, as plantas começaram a atribuir  a certas seções da  colônia,  e  não  apenas a determinadas células, tarefas específicas. Isso resultou no aparecimento de órgãos, tais como raiz, tronco, galhos e folhas, que permitiram a evolução de plantas de alto nível. Assim como antes,  o fator determinante do sucesso ou da falha do novo estágio evolucionário foi o “consentimento” das células ou órgãos dentro do sistema hospedeiro em abdicar de seu interesse próprio em favor do sistema inteiro, nesse caso, a planta.

Animado

Por cerca de dois bilhões de anos, as plantas dominaram o planeta Terra. O desejo de receber que quebrou o Partzuf de Adão, porém, possuía mais facetas que precisavam de correção, isto é, era necessário serem ensinadas a trabalhar como um sistema, abdicando de seu interesse egoísta em prol do interesse do sistema hospedeiro. Como os desejos continuaram a emergir, aqueles que eram correlacionados ao Estágio Três dos quatro estágios começaram a se manifestar, criando formas de vida mais complexas.

Por causa de seu alto nível de desejo, explicado por Ashlag em sua “Introdução ao Livro do Zohar”, cada espécime pertencente ao Estágio Três tinha um elevado senso de autodeterminação e um maior desejo por autonomia. Assim, enquanto os espécimes continuaram a se reconhecer como partes de uma espécie, começaram a desenvolver identidades individuais.xix

Os corais, por exemplo, que evoluíram há aproximadamente 500 milhões de anos, estão entre as primeiras espécies de animais a surgir. Alguns desenvolveram (uma forma primitiva de) músculos que permitiram seu movimento, e assim se tornaram aptos a se moverem com relativa liberdade. Além do mais, diferentemente das plantas, que proveem suas necessidades nutricionais pela fotossíntese, os corais precisam se prender  a outros organismos para se sustentar e frequentemente contêm células de algas que realizam a fotossíntese e asseguram o suprimento de carboidratos (açúcares) (Imagem 3).

Imagem 3: Ao contrário das plantas, que fazem fotossíntese para sua nutrição, corais se alimentam se prendendo em outros organismos.

Os corais, no entanto, possuem outra forma de tecido característico dos animais: nervos. O surgimento do sistema nervoso, particularmente do Sistema Nervoso Central (SNC), permitiu maior controle sobre as funções do organismo e facilitou a evolução da fauna diversificada que existe hoje.

Abaixo está uma linha do tempo muito aproximada dos 3,8 bilhões de anos da história  da vida na Terra, demonstrando como os desejos se manifestam na evolução:

Inanimado — Estágio Um
  • 3,8 bilhões de anos até o surgimento de células simples (procariontes);
Vegetativo — Estágio Dois
  • 3 bilhões de anos até o surgimento de fotossíntese;
  • 2 bilhões de anos até o surgimento de células complexas (eucariontes);
  • 1 bilhão de anos até o surgimento de vida multicelular.
Animado — Estágio Três
  • 600 milhões de anos até o surgimento de animais simples;
  • 570 milhões de anos até o surgimento de insetos;
  • 550 milhões de anos até o surgimento de animais complexos;
  • 500 milhões de anos até o surgimento de peixes;
  • 475 milhões de anos até o surgimento de plantas terrestres;
  • 400 milhões de anos até o surgimento de sementes;
  • 300 milhões de anos até o surgimento de répteis;
  • 200 milhões de anos até o surgimento de mamíferos;
  • 150 milhões de anos até o surgimento de aves;
  • 130 milhões de anos até o surgimento de flores;
  • 65 milhões de anos até a morte de dinossauros não alados;
Humano (Falante) — Estágio Quatro
  • 2,5 milhões de anos até o surgimento do gênero Homo;
  • 000 anos até o surgimento do Homo Sapiens.

Como podemos ver na lista acima, a evolução das espécies e a evolução dos desejos correspondem bastante bem. O próximo capítulo será dedicado ao aparecimento e à evolução do Estágio Quatro do desejo de receber na Terra —“o falante” — ou seja, o ser humano.

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